segunda-feira, 21 de junho de 2010

Roberto Campos, o exército de um homem só


Algumas palavras podem definir Roberto Campos: tecnocrata, pragmático, lúcido, liberal ou mesmo um idiota da objetividade como o intitulou o amigo Nélson Rodrigues. Para o economista, os bons exemplos, o que deu certo em outras nações, deveria ser copiado, pois os fundamentos eram basicamente os mesmos. Mas seguir o que deu certo é uma coisa difícil no Brasil, ainda mais nos tempos de Campos. Sua vida mistura-se com a vida do país por toda a segunda metade do século 20, mas mesmo sendo fundamental em muitas decisões da nação, no geral, o liberal foi um solitário.

Roberto Campos ajudou Getúlio Vargas a criar a Petrobras, que se dependesse dele seria de capital misto e não estatal. Campos também era contra o monopólio da empresa, a qual mais tarde passou a chamar de Petrossauro.

Após romper com Getúlio, reaparece no governo de JK, sendo o pai do Plano de Metas que tinha 3 linhas principais:

1) Austeridade orçamentária
2) Liberação cambial
3) Plano de desenvolvimento, o que JK mais gostou.

A construção de Brasília, com o conseqüente monumental dispêndio de verba, foi uma decisão única de JK, sobre a qual Roberto Campos foi contra.

Após toda turbulência do período Jânio/Jango, Roberto Campos torna-se ministro de Castelo Branco e juntamente com Octávio Bulhões, estabilizou a Economia contendo a inflação. Foi o período que Roberto Campos gozou de maior poder decisório.

Nas décadas de 50 e 60 foi defenestrado tanto pela esquerda, quanto pela direita nacionalista. A esquerda chamava-o de entreguista e alcunharam-no jocosamente de Bob Fields, insinuando submissão aos interesses estrangeiros. A verdade é que Campos não se preocupava com a nacionalidade dos investimentos, mas com os investimentos em si e o benefício que eles proporcionavam.

Já Carlos Lacerda disse que Campos matava os ricos de ódio e os pobres de fome. O “corvo” (apelido de Lacerda) não gostava da contenção orçamentária que Campos mantinha. A constituição de 1967 cujos artigos econômicos foram de autoria de Campos, segundo o próprio, foi a constituição menos inflacionista do mundo. Um dos artigos não permitia que o congresso nacional
fizesse emendas ao orcamento que aumentassem os gastos públicos da União.

As palavras de Lacerda eram pura injustiça, na verdade tratava-se de ressentimento por não poder dar vazão aos seus anseios político/populistas. O plano de Campos no período de JK criou milhares de empregos no Brasil. O ajuste orçamentário no governo Castelo Branco saneou as finanças do governo e o bom ambiente para Economia propiciou a gênese do milagre econômico brasileiro. Neste período atribui-se que mais de 30% da população brasileira saiu da faixa de pobreza.

Contudo, após a linha-dura assumir o poder, iniciou-se uma onda estatizante a qual Roberto Campos foi contrário. Sem poder alterar o curso das coisas, ele deixou o governo e o país, fazendo como que um exílio branco.

Na verdade um exílio bem confortável e proveitoso. Campos ficou na Inglaterra e acompanhou de perto a subida ao poder de Margaret Thatcher e o início de suas reformas.

Roberto Campos voltou ao Brasil no início da década de 80 e foi deputado constituinte. Aí viria sua grande tristeza. Nenhum projeto seu foi aceito para ser incluído na nova carta magna do país. A constituição lhe parecia um arroubo de garantias irreais que prometia tudo, mas não dizia de onde viriam os recursos. Em vários pontos era ilusória e demagógica, apenas para os políticos posarem de bem feitores sociais. Campos batizou-a de constituição-besteirol e ressalvou que ela travaria o desenvolvimento do país.

Roberto Campos não quis assinar a carta magna por considerá-la anticapitalista. Já o PT não quis assinar por achá-la muito pouco socialista. Um cérebro contra uma turba e um bando de néscios no meio a amenizar a situação.

Durante o plano cruzado de José Sarney, com seu congelamento de preços socialistóide, foi uma das poucas vozes a criticá-lo, ao contrário de uma professora e também mentora do PT (chegando a se eleger deputada federal posteriormente pelo partido) que chorou de emoção ao decreto do referido plano. O fracasso de tal plano que como todo projeto socialista gerou escassez de produtos, mostrou quem tinha razão.

Já no período Collor, Campos aprovou a abertura econômica do país. O proteccionismo nacional era demasiadamente elevado. Contudo votou pelo impeachment de Collor. Convenhamos, não há nada mais anti-liberal do que o confisco na poupança que o presidente “Minha gente” fez.

Finalmente chegamos ao governo Fernando Henrique. A venda das paquidermes estatais oriundas de Getúlio Vargas e dos militares, empresas deficitárias que o governo mantinha à custa de impostos e impressão de papel-moeda, auxiliaram o plano Real ser bem-sucedido. A inflação baixou, o trabalhador não precisava mais sair correndo para fazer as compras do mês antes que os preços aumentassem. O imposto mais pernicioso para os trabalhadores e para os mais pobres finalmente estava controlado.

A inflação não era causada pela ganância dos empresários, como havia dito uma vez Luís Inácio Lula da Silva, mas sim pela expansão monetária do governo que, ineficiente, recorria à incrível máquina de fazer dinheiro da Casa da Moeda para cobrir seus gastos.

Mas as privatizações foram satanizadas pela mesma turma que foi diametralmente contrária a Roberto Campos por ocasião da constituição de 1988.

Para garantir as benesses sociais da constituição de 1988 e também para cobrir seus próprios custos sem lançar mão de expansão monetária, os impostos subiram do patamar de pouco mais de 20% do PIB para mais de 30%. Hoje estamos com quase 40% do PIB abocanhado pelo estado, uma das razões para o baixo crescimento da economia brasileira em comparação com de outros países em desenvolvimento.

O antigo sindicalista chegou ao poder já depois da morte de Roberto Campos, mas sabiamente (ou “sabidamente”) manteve a linha econômica do governo anterior, mas sem deixar de satanizá-lo e muito menos agradecer a herança bendita da estabilização econômica que só correu risco verdadeiro na iminência de sua eleição. A carta do PT aos brasileiros trouxe um pouco mais de tranqüilidade aos mercados.

Para Roberto Campos a pobreza deixou de ser uma fatalidade, para se tornar o subproduto de opções erradas e de desvios de comportamento. Segundo ele, conhece-se hoje a grande síntese do desenvolvimento sustentado: razoável estabilidade de preços na macroeconomia; competição na microeconomia; abertura internacional; e investimentos maciços no capital humano. As vigas do edifício são o respeito à liberdade empresarial e ao direito de propriedade.

Este foi Roberto Campos, um homem que teve opiniões sensatas e incrivelmente corretas, a ponto de serem proféticas, no decorrer da vida. Nota-se que nas tomadas de decisão sobre os rumos do país havia os que tinham opinião errada; os que não tinham opinião e levavam-se ao sabor do vento; e ele, Roberto Campos, que possuía a opinião mais coerente, mas que só depois da nação perder 20, 30 ou mais anos na direção errada é que se dava razão ao economista.

O monopólio da Petrobrás; a Lei da Informática, de 1984, que rejeitava capitais estrangeiros nesse setor; e a exigência de maioria de capitais nacionais na exploração mineral pela Constituinte de 1988; todas foram coisas as quais Roberto Campos lutou contra, e perdeu.

As consequências, em ordem, são: 1) temos uma das gasolinas mais caras do mundo; 2) o país perdeu quase 10 anos com tecnologia informática defasada; e 3) a Cia Vale do Rio Doce após ser privatizada se tornou uma gigante mundial do setor, demonstrando como estava aquém do seu potencial quando gerida pelo governo.

Disse ele uma vez, parafraseando De Gaulle: “Estive certo quando tive todos contra mim”. Realmente esteve, e para azar do Brasil, ele não foi ouvido.

Ao cair o muro de Berlim em 1989 e com os acontecimentos do início da década de 90, a Folha de São Paulo publicou um texto intitulado: “Ok Bob, você estava certo!” Sobre tais acontecimentos Roberto Campos sentenciou: “O colapso do socialismo não foi mero acidente histórico, resultante da barbárie da União Soviética ou da perversão de carniceiros como Stalin e Mao Tsé-Tung. Era algo cientificamente previsível. Os aludidos cientistas sociais teriam certamente chegado a essa conclusão se, ao invés de treslerem a história, tivessem lido os grandes liberais austríacos”.

Hoje em dia, em debates, sobretudo via Internet, as pessoas que argumentam contra as falácias socialistas e congêneres, se utilizam das frases espirituosas e lúcidas de Roberto Campos. Não seria exagero dizer em nome desses e de todos que tentam diariamente gerar valor para a sociedade:

Ave, Campos! Os que lutam em nome da livre iniciativa te saúdam!

domingo, 13 de junho de 2010

A benção, João de Deus


Poucas pessoas parecem ter sido tão escolhidas a dedo para ocupar um cargo como o papa João Paulo II. Primeiro papa não-italiano dos últimos 455 anos da Igreja Católica, Karol Wojtila era polonês. Filho da mesma Polônia católica que fôra palco da divisão entre nazistas e comunistas, em 1939, logo após o tratado nazi-comunista de não agressão.

Karol Wojtila conheceu de perto o horror dos nacionais-socialistas de Hitler e logo após, e durante mais tempo, do totalitarismo de Stálin. Vivia então sob a opressão de um regime que negava Deus e que punha apenas o marxismo no seu lugar.

Desde sua primeira encíclica, “Redemptor hominis”, de 1979, e seu primeiro documento social, o “Laborem exercens”, de 1981, ele combateu o comunismo, ao qual criticou por causa do ateísmo e da perseguição dos cristãos, mas também pelos aspectos antropológico e sociais, como sistema injusto que alienava a pessoa humana.

João Paulo II foi o papa que mais visitas fez aos outros países, tal qual o bom pastor que cuida de seu rebanho. Carismático, suas reuniões reuniam milhares de pessoas. Foi numa dessas, talvez uma das mais importantes, que, de volta à sua terra natal, após ter ouvido seus patrícios gritarem pelas ruas “Queremos Deus!Queremos Deus!”, o papa exclamou: “Não tenham medo!”. A frase referia-se claramente à opressão dos comunistas face à liberdade e à religiosidade.

As palavras de João Paulo II foram como fermento numa massa de pão. Os movimentos anticomunistas se reacenderam na Polônia e serviram de exemplo para demais países subjugados pela cortina de ferro. Havia também o medo no Ocidente de um novo conflito mundial de proporções letais para Humanidade. João Paulo II novamente renegou o medo e afirmou a confiança em Cristo.

Em conversa com o jornalista católico Vittorio Messori, o Papa João Paulo II disse: “Seria simplista dizer que a Providência provocou a queda do comunismo. Ele caiu por si mesmo, como conseqüência de seus próprios erros e abusos. Caiu por si mesmo por causa de sua própria e inerente fraqueza”.

Mesmo diante de tais palavras, muitos historiadores justamente reconhecem o papel fundamental do papa na derrocada do comunismo.

Disposto ao diálogo e ao entendimento, encontrou-se com muçulmanos, cristãos ortodoxos e protestantes. Pediu perdão aos judeus e também pelas injustiças cometidas pela Inquisição. Fez a expiação dos erros do passado, mas mirou o futuro, reassumindo o compromisso com a fé católica.

João Paulo II também viu surgir no seio de sua Igreja um movimento que utilizava a retórica da luta de classes, a Teologia da Libertação, propalada por padres da América Latina. Condenando tal doutrina, chamou seus pastores, apontando para as falhas de uma filosofia equivocada e enganosa.

Apesar de sempre buscar a pregação aos jovens, o papa não abriu mão de princípios conservadores. A família é o tijolo fundamental da sociedade e da vida de cada pessoa, por isso a importância de se fortalecer o sacramento do matrimônio.

Embora tenha ficado do lado Ocidental durante a conturbada época da Guerra Fria, isto não deixou que João Paulo II fizesse suas críticas ao mundo que estava se delineando diante de si. Para ele a democracia não devia ser canonizada, os fundamentos morais e éticos deviam estar em primeiro lugar do que a simples escolha da maioria. É importante lembrar que Hitler foi democraticamente eleito e mesmo Jesus Cristo foi crucificado ante consulta popular.

João Paulo II chegou ao fim da vida como santo papa. Já no seu leito de morte, milhares de pessoas se reuniram na praça da Basílica em Roma para orar por ele. Ao saber da quantidade de jovens que lá estavam, disse a eles:

“Durante toda minha vida fui ao encontro de vocês, e agora, no final de minha vida, vocês vêm até mim!”

A gratidão dos jovens de todas as idades é que fez tantas pessoas se moverem à ele; e se a fé move montanhas, a fé de João Paulo II moveu muito mais. À ele só posso dizer: a benção, João de Deus!

sábado, 5 de junho de 2010

Um Nobel para o Além



"Sr. Gorbachev: Abra este portão... Sr. Gorbachev: Derrube este muro!” (Ronald Reagan, Berlim, 1987)

No dia 5 de Junho de 2004 faleceu o ex-presidente dos EUA, Ronald Reagan. Reagan foi presidente de 1980 a 1989. Para mim que era uma criança na época, tenho a lembrança de achar estranha a notícia daquele presidente que anunciava um sistema de defesa que a imprensa batizou de Guerra nas Estrelas. Parecia uma grande firula. Apenas anos depois, e não na escola, aprendi o que aquilo significava e a importância de Ronald Reagan para o mundo.

Ao discursar pela primeira vez como presidente, Reagan disse que o governo não era a solução, mas sim o problema. Isso fazia sentido pelo fato de décadas de dirigismo estatal na economia americana terem levado o país a uma situação que chamavam de estagflação, ou seja, estagnação econômica com inflação.

Reagan implementou algumas reformas que permitiram o crescimento econômico e a revitalização da economia americana. Isto permitiu que ele realocasse recursos para um grande fator de preocupação mundial da época: o perigo nuclear sob o signo da guerra fria.

Reagan chamava a ex-URSS de “Império do Mal” e juntamente com Margaret Thatcher e Karol Wojtila, o papa João Paulo II, foram os grandes personagens na derrocada do maior flagelo do século 20: o comunismo.

O ditado romano “Se queres a paz prepara-te para guerra.”, parece ter permeado o pensamento de Ronald Reagan. Se Reagan tivesse ouvido os politicamente corretos e sua inteligentsia (intelectuais), o comunismo ainda perduraria por algum tempo. Parece que a postura da referida classe não muda muito tanto lá quanto cá.

Reagan sabia que a economia soviética não teria condições de acompanhar uma escalada dos gastos em defesa por parte dos Estados Unidos. Apesar dos intelectuais que apregoavam a derrocada iminente do capitalismo e o inevitável triunfo do socialismo, a verdade é que a URSS não passava de um tigre de papel. A ferrenha oposição dos líderes soviéticos - inclusive Mikhail Gorbachev - à Iniciativa de Defesa Estratégica - que os inimigos de Reagan apelidaram desdenhosamente de "Guerra nas Estrelas" - representava o reconhecimento de que não poderiam desenvolver um sistema semelhante, a menos que virtualmente parassem a economia soviética.

As políticas Glasnost (Abertura) e Perestroika (Reestruturação) por Mikhail Gorbachev nada mais foram do que os atestados de que a URSS não podia mais competir na guerra fria. Talvez a maior conseqüência e o símbolo disso tenham ocorrido na Alemanha Oriental, com a queda do Muro de Berlim e a festa do povo que estava subjugado há anos pela opressão comunista.

O ator de “limitados recursos intelectuais”, foi o grande responsável pelo fim do modelo esquerdista clássico mundial. Seus críticos só esquecem de dizer que além de ator e radialista, Ronald Reagan cursou Economia e Sociologia trabalhando para custear seus estudos na Eureka College.
Reagan tem status de super-herói nos EUA, e no leste Europeu tem o reconhecimento de ter sido um grande semeador da liberdade em povos que foram dominados por décadas de totalitarismo, tendo isso custado não somente o cerceamento das liberdades individuais quanto o de milhões de vidas humanas.

Não foi à toa, portanto, que tenha sido em Praga, capital da antiga Tchecoslováquia, invadida por tanques soviéticos na década de 60 a fim de que o país permanecesse sob a influência da URSS, que Margaret Thatcher homenageou Ronald Reagan citando um poema de Byron em que dizia:

Espírito eterno do pensamento desacorrentado
Liberdade!
Mais brilhante és nas masmorras,
Pois lá a tua única morada é o coração
O coração que só o amor por ti pode unir
E quando seus filhos são subjugados aos grilhões
Aos grilhões e à obscuridade da cela úmida
A nação vence com martírio
E o nome da Liberdade encontra asas em todos os ventos

Parabéns Ronald, um Nobel, que nunca lhe deram, é pouco para você. Seu legado será lembrado e eternamente agradecido pelos que prezam a liberdade e a verdadeira construção de um mundo melhor.