domingo, 14 de dezembro de 2008

Documentação

Janer Cristaldo escreveu um ótimo livro-reportagem denominado: "Ianoblefe - o jornalismo como ficção". Ele está publicando trechos no seu blog, mas o livro pode ser inteiramente acessado na Net.

No decorrer dos dias, como nenhum cadáver havia sido achado, o número de chacinados foi diminuindo. Foi fixado finalmente em 16. A única prova da chacina foi... um dente, encontrado pela Polícia Federal e exibido em grandes fotos pela imprensa, na ponta do dedo de um policial. Em verdade, não foi encontrado um só cadáver.

Relato toda essa farsa em Ianoblefe - o jornalismo como ficção. O livro foi recusado por cerca de vinte editoras. "Não podemos nos indispor contra todos os jornais do país", resumiu um editor. Mas foi aceito pela Ebooksbrasil, tocada por Teotonio Simões, e pode ser baixado de http://www.ebooksbrasil.org. Recomendo.

Cadáveres, nenhum. Mas o juiz Catta Preta não tem dúvidas de que houve o massacre. Como prova do crime, aceitou laudos de antropólogos sobre os hábitos culturais dos ianomâmis ...

Os uaicás, xirianás, iecuanás, macus e maiongongues, segundo Menna Barreto — ou ianomâmis, como os rebatizou Andujar — têm hoje a posse de 9,4 milhões de hectares, uma extensão territorial que jamais conseguirão controlar.

Não bastasse esta imensidão de terras entregue por Collor de Mello a um punhado de seres primitivos, incapazes de constituir ou gerir um Estado, o presidente Fernando Henrique Cardoso acaba de demarcar uma área ainda maior, de 10,6 milhões de hectares (território equivalente a Cuba) na região conhecida como Cabeça do Cachorro, no noroeste do Amazonas. A demarcação, feita com patrocínio do G-7 (grupo formado por EUA, Japão, Canadá, Alemanha, França, Grã-Bretanha e Itália) revoga e engloba 14 "ilhas" descontínuas, criadas durante o governo Sarney (1985-90).

Antes da nova demarcação, as 14 "ilhas" tinham apenas 2,6 milhões de hectares. Esta Cuba será entregue a cerca de 30 mil índios, quase 10% da população indígena do Brasil, espalhados em 600 comunidades de 23 etnias, como baré, suriana, maku, baniwa e tucano, entre outras.

Detentores de 11% do território nacional, os 325 mil índios brasileiros se candidatam fortemente à condição de maiores latifundiários do planeta.

Ironicamente, habitam o mesmo país em que o Movimento dos Sem-terra (grupos armados de fuzis, foices e facões, organizados pela Igreja Católica) invade e desmonta propriedades produtivas, com técnicas de guerrilha e sob as bandeiras de Mao Tse Tung e Che Guevara.

Alegam os defensores dos “povos da floresta” que todo o território brasileiro lhes pertencia, antes da chegada dos portugueses. Ocorre que os nativos não pediram passaporte a Cabral, nem lhe exigiram visto de entrada. Ora, sem Estado constituído, povo algum pode pretender a posse de qualquer território.

Postos em quarentena pela antropologia militante, isolados deste século por uma política oficial de Brasília, uma merencória opção é deixada aos autóctones de Pindorama: morrer de fome ou depender da caridade pública. Integrar-se ao século XX, jamais: os antropólogos precisam preservar, congelados no tempo, seus objetos de estudo.

E assim prepara-se o Brasil para entrar no terceiro milênio. Deixando para trás, perdidos no passado, seus primeiros habitantes.

http://cristaldo.blogspot.com/2008_12_01_archive.html