terça-feira, 13 de outubro de 2009

A dialética da mentira - II



Em artigo posterior elenquei três afirmações comumente repetidas pelos militantes indigenistas e que tentam gerar um sentimento de culpa na sociedade.

Antes de comentá-las vou reforçar algo: sem dúvida nenhuma há um problema envolvendo os indígenas da região sul do estado, mas ele deve ser resolvido racionalmente e sem mistificações.

Dito isto, vamos às três afirmações citadas, juntamente com os devidos comentários.

1. Confinamento indígena:

Se os índios de fato não pudessem sair das aldeias eu também diria que eles estão confinados. Mas não é o que ocorre. Os índios podem entrar e sair das aldeias à vontade, como cidadãos brasileiros que são. Andam pela cidade, muitos trabalham, estudam, etc. Seria o mesmo que dizer que moradores de um condomínio de casas ou apartamentos estão confinados.

Mais de 13% do país se constitui como reserva indígena, isso para uma população muito menor do que a não-índia. Sem falar que nas reservas apenas a policia federal tem autorização de entrar. Com uma população maior e uma área relativamente menor possível de ocupação, paradoxalmente os não-índios estão mais confinados que os índios.

Os índios da região sul do estado gozam de menos terra do que outras etnias do país. Isto se explica pelo fato de que as terras de fronteira, ou de todo MS, tiveram sua colonização incentivada em vista do término da guerra do Paraguai, com a finalidade de garantir a soberania brasileira na região. Isto é histórico, sempre que um país quer garantir a posse sobre um território, ele incentiva a ocupação pelos seus habitantes.

Como os guaranis não tomaram partido naquela guerra, eles ficaram de fato preteridos na posse da terra. É bom que se diga: se dependesse dos guaranis, aquelas terras pertenceriam ao Paraguai. Não os julgo por isso, mas é um fato.

Se houve uma injustiça no passado, ao não se destinar áreas maiores para os índios, ela não será corrigida mediante mais injustiças no presente. A maioria dos atuais proprietários pagou pela terra, e o que a FUNAI planeja (ou planejava) fazer não tem outro nome senão expropriação. Também os descendentes dos pioneiros que tiveram coragem para enfrentar as dificuldades do antigo sul do Mato Grosso não podem ser tratados como invasores, pois são famílias que estão há mais de cem anos no local.

De toda forma, o termo “confinamento indígena”, na acepção do significado, é errôneo.

2- Genocídio indígena:

Eles dizem que há um genocídio pelo elevado número de suicídios e assassinatos nas aldeias e também pela alta mortalidade infantil. Mas há também uma elevada taxa de natalidade entre os índios. Aí os militantes se calam. A verdade é que há um crescimento vegetativo acentuado nas populações indígenas, descaracterizando completamente o termo “genocídio”.

Haviam aldeias como a Jaguapirú, extremamente próxima a Dourados, que contavam com 400 pessoas no inicio de sua formação e hoje possuem mais de 11 mil. Isto se deu tanto pelo alto crescimento vegetativo dos moradores quanto pela vinda de indígenas de outras regiões, que sabem das vantagens em se morar perto dos recursos da cidade. A felicidade idílica da mata só existe na cabeça de alguns românticos.

A grande beleza da questão indígena é tê-la para resolver. Há países que não tem esta questão, porque, estes sim, praticaram genocídio. Foi o caso da Argentina e Nova Zelândia. Nos EUA também houveram conflitos bem maiores. O início da colonização portuguesa no Brasil também foi conturbada.

Eu insisto em dizer, mesmo com percalços o contato entre índios e não-índios no atual Mato Grosso do Sul foi um dos mais pacíficos da história da Humanidade. E espero que, para nosso orgulho, continue assim sendo.

Os suicídios cessarão quando os índios resgatarem sua auto-estima. Os assassinatos cessarão quando houver segurança para os bons indígenas e punição para os maus elementos. A mortalidade infantil cessará com educação familiar e emancipação econômica.

3- Dívida histórica para com os indígenas:

Aqueles que de fato pensam que os índios estariam melhores caso não tivessem tido contato com o não-índio deveriam ponderar bem como era a vida dos antigos indígenas.

Os índios andavam nús e descalços pelas matas. Faziam suas necessidades em ambiente aberto. Comiam os animais que conseguiam caçar, macacos, pacas, capivaras, em geral sem nem retirar os pêlos, assando o animal por inteiro num braseiro. A agricultura era rudimentar e de subsistência. Tinham parcos utensílios no dia-a-dia. Eram essencialmente coletores. Não tinham desenvolvido a escrita.

Qual era a expectativa de vida do homem antes de domesticar animais para alimentação e de uma agricultura menos rudimentar? Acho que menos de 40 anos.

Seriam fortes e bem nutridos? Havia sal na sua alimentação? A mortalidade infantil seria menor que a de hoje? Desconfio que as respostas para isso sejam todas negativas.

Quanto cobraríamos pelos royalties da luz elétrica, das vacinas, antibióticos (ou vocês acreditam que os índios não adoeciam?), roupas, alimentos empacotados, água encanada, chuveiro, vaso sanitário (por que não?), fogão, geladeira, etc?

Vou dizer quanto: nada. Não devemos cobrar nada. Assim como os índios não podem nos cobrar nada.
A Humanidade só evoluiu com as trocas voluntárias propiciadas pelas sociedades abertas. Praticamente todos os povos do mundo em algum momento da história tiveram enfrentamentos e atritos. Se cada um ficar com picuinhas, cobrando “dívidas” dos outros, entraremos numa espiral de acusações e animosidade improducente.

Ainda, como lembra Waren Dean, em seu livro "A Ferro e Fogo - A história da Floresta Atlântica do Brasil" (Editora Companhia das Letras, 1994), tanto os tupis como os guaranis foram tribos que faziam poucos séculos, na época em que os portugueses descobriram o Brasil, que invadiram a região e desalojaram outras tribos indígenas, cuja história perdeu-se na poeira dos tempos.

“Guarani” significa “guerreiro”. Notamos aí como o mito do bom selvagem é uma balela completa. Não obstante o fato de que havia escravagismo também entre os índios. Os guaicurus, por exemplo, eram uma tribo que submetiam outros índios à escravidão.

Por isso sou tão categórico em não me render a romantizações e nem vitimizações para com os indígenas. Mas defendo totalmente a sua igualdade perante as leis e espero que de fato sejamos uma sociedade aberta para eles.