domingo, 27 de setembro de 2009

O rio Taquari e seu custo de recuperação



Há um rio no Mato Grosso do Sul que foi enterrado vivo. É uma expressão um pouco mais poética para o que é tecnicamente chamado de “assoreamento”. O rio Taquari era um dos mais piscosos do estado, fazendo parte da bacia do rio Paraguai. Hoje se pode andar por cima dele, a lâmina d’água é de poucos centímetros, com grandes bancos de areia na sua extensão. Praticamente não existem mais peixes para se pescar. Houve locais em que o rio saiu completamente da sua calha, inundando hectares de pastagens.

Muito tem se falado neste problema, nestes quase 30 anos de assoreamento, mas houve uma falta de foco objetivo na questão. Há uma proposta recente, ela pode ser viável, mas temo que despenda um elevado montante de dinheiro público. Segundo o senador Delcídio do Amaral, serão 54 milhões de reais apenas para uma parte do programa.

Farei aqui uma sugestão alternativa, praticamente sem ônus para os cofres públicos, mas primeiramente vamos entender o que levou o assoreamento do rio:

Na década de 70 os pecuaristas começaram a implantar a braquiária, um capim que proporcionava três vezes mais lotação animal do que o capim nativo, basicamente constituído de cerrado. Em algumas áreas implantou-se primeiro lavouras, em geral de soja, e depois a braquiária; em outras áreas menos aptas para agricultura procedeu-se a substituição direta pelo novo capim.

Pois bem, como os produtores de então eram um tanto desconhecedores no manejo de solo e de pastagem, cometeram alguns erros crassos. São eles:

1º Não respeitaram a mata ciliar, desmatando até o leito do rio ou muito próximo dele. Isto em muitos casos foi procedido pelos arrendatários ou pelos prestadores de serviço que queria fazer mais horas-máquina.

2º Não fizeram curvas de nível a contento.

3º Manejaram mal a pastagem, que abaixou demais, deixando o solo mais descoberto e suscetível a ação da água da chuva.

4º Para piorar o gado continuava a beber água no rio, desbarrancando as margens. Anteriormente também bebiam, mas em pontos específicos e a mata ciliar protegia de se ocorrer maior desbarrancamento.

Tudo isto e em conjunto com a estrutura de solo da região que é extremamente arenoso, acabou levando toneladas de areia para dentro do rio pela ação das chuvas.

Qual a grande dificuldade para não se resolver o problema? O custo de recuperação da mata ciliar. Simplesmente aplicar multas não resolve a questão. Elas vão para a caixa-preta estatal sumindo na sua correta destinação que seria a recuperação ecológica. Penalizar produtores já descapitalizados não vai melhorar o ambiente ecológico.

Qual a proposta de ação então? Um plano integrado de manejo tendo como mola mestre empresas de reflorestamento, preferencialmente de eucalipto, mas que também plantariam espécies nativas nas barrancas do rio. Estas empresas seriam arrendatárias da área, e o dinheiro que pagariam como renda ao dono da terra, seria permutado pela recuperação da mata ciliar, afinal elas sabem plantar árvores em grande escala, os pecuaristas muito pouco e o governo muito menos ainda.

O ideal era que se abandonasse a pecuária naquelas terras, e isto por um bom tempo. Os produtores viveriam do capital do gado vendido e da renda que sobraria do eucalipto, descontado da área a ser recuperada.

Mas vamos supor que alguns proprietários não quisessem deixar de ter seu gado e nem perder área de pecuária. O viável neste caso era que as empresas agissem exclusivamente na mata ciliar, em um primeiro momento plantando até eucalipto nestas áreas (para isso teria que se adequar a legislação que atualmente não permite isso), sendo que aos poucos iria se substituindo o eucalipto pelas espécies nativas.

Então vamos passo-a-passo:

1. Proporcionar aguadas fora do rio para os animais, podem ser constituídas de poços artesianos, moinhos de vento, ou rodas d`água onde for possível. Pode haver financiamentos facilitados para os pecuaristas procederem isto.

2. Fazer curvas de nível conforme o terreno necessitar.

3. Treinamento de produtores para que as pastagens sejam manejadas sempre deixando-se uma altura mínima de cobertura (ao redor de 30 cm), ou seja, não pode haver “pasto rapado”.

Importante:

4. Delimitar a área de mata ciliar. Por exemplo: 100 metros. No primeiro ciclo de plantio (em torno de 7 anos), as empresas plantariam 10 metros do rio de árvores nativas, e os 90 metros restantes de eucalipto. Assim seria feito sucessivamente, até que se completasse os 100 metros de mata ciliar. Lógico que estes valores estão estimados e que deveriam ser determinados pela empresa, juntamente com agentes do meio ambiente e os proprietários.

Provavelmente quando se tiver pouca área de eucalipto e mais de mata ciliar o custo para a empresa seja proibitivo. Neste caso há que se ver a possibilidade de mesclar na mesma área, árvores nativas e eucalipto. Tenho certeza que as partes envolvidas com diálogo e moderação, deixando certas amarras da legislação de lado, cumprirão o objetivo de recuperar a mata ciliar.

Com o tempo o rio recuperará sua calha, para isto acontecer ele não pode mais receber areia do solo. Pode se estudar a possibilidade de areeiras trabalharem na região, retirando a areia do que virá a se tornar a calha do rio.

A recuperação do rio tem que ser economicamente viável, se não for, sempre será difícil realizá-la, e não há incentivo melhor do que o econômico para isso.

O senador Delcídio do Amaral revelou presteza e boa vontade em se resolver a questão. Mas acontece que os pagadores de impostos não devem arcar com um ônus que não é deles. 54 milhões é uma soma considerável, e ela é apenas inicial.

Quanto se gastaria ao final do projeto? 100, 200 milhões? Não sei. O pior é que ainda poderia se gastar o dinheiro público e a obra em algum momento ficar parada como já aconteceu em muitos investimentos estatais.

Este valor que o senador Delcídio já viabilizou em Brasília poderia ser usado na melhoria das condições locais, no financiamento aos produtores, em melhorias de estradas, em postos de saúde, em escolas, creches, etc.

Volto a insistir: o rio Taquari pode ser recuperado sem que se gaste vultosas somas de dinheiro público. Basta vontade e bom senso para isso.