domingo, 20 de setembro de 2009

Preservação ilusória


Em recente artigo ao Correio do Estado (14/08/09), o meu querido ex-professor de Doenças Parasitárias, Hermano de Melo, fez menção ao meu nome, referindo-se ao meu artigo intitulado “A destruição criadora” (Correio do Estado, 03/08/09). Fico feliz que o professor Hermano hoje seja um acadêmico de jornalismo, tenho certeza que ele trará contribuições à área.

Primeiramente gostaria de dizer que meu texto não é “neocapitalista” (!?), “oligárquico” e “positivista”, como ele classificou, relacionando com os comentários sobre uma matéria da jornalista Jacqueline Lopes do site Midiamax. Não vou me ater sobre isso; tenho um suporte teórico sim, mas tento escrever sempre escorado no bom senso, que julgo ser o mais importante.

Em momento nenhum falei que os costumes indígenas deveriam ser extintos. Falei que o antigo modo de vida ou sistema de produção indígena foi confrontado com um sistema mais eficiente. O porquê está exposto naquele texto.

Schumpeter utilizou a expressão “destruição criadora” em sistemas de produção regidos pela economia de mercado. A ausência de mecanismos ou incentivos para esta destruição criadora nas economias planificadas socialistas do século 20, foi uma das muitas causas para o fracasso do socialismo em todo lugar do mundo onde ele foi posto em prática.

Esta expressão da Economia foi transposta para a questão indígena, salvo engano, pelo professor e filósofo Denis Rosenfield. Eu apenas discorri mais sobre o assunto.

O professor Hermano cita que os costumes indígenas devem ser preservados a exemplo das múmias dos faraós, do coliseu de Roma, das grandes navegações do passado, etc. Ora professor, me desculpe, mas penso que o sr. comparou alhos com bugalhos ou, pior ainda, mostrou sua verdadeira face de “preservacionista cultural”.

Para explicar melhor isso e como eu não podia escrever melhor do que a fonte, transcrevo dois parágrafos do livro “Uma Luz na Escuridão” de Rodrigo Constantino:

“O filósofo Kwame Anthony Apiah chama de preservacionistas culturais aquelas pessoas com bom padrão de vida, geralmente de algum país ocidental, que olham para as culturas diferentes e exóticas como algo interessante, bonito e que deveriam ser mantidas para sempre da mesma forma. Ainda segundo Thomas Sowell, tal visão é uma afetação que algumas pessoas podem se dar ao luxo de ter enquanto estão usufruindo de todos os frutos da tecnologia moderna.

Mas como disse Anthony Apiah: “Uma cultura só tem valor se é boa para o indivíduo”. Manter uma visão coletivista em detrimento da livre escolha de cada pessoa, em certos casos beira o desumano.”

Não se trata de querer doutrinar os índios, ou proceder algo parecido, como por vezes aconteceu no passado. Quem deve decidir o que deve ser mantido ou não da sua cultura são os próprios índios, e não eu ou o professor Hermano. Tampouco se trata de simplesmente desprezar o que é antigo, de maneira nenhuma, mas apenas de optar pelo que cada pessoa considerar melhor ou mais conveniente.

A propósito, comparar as múmias dos faraós com os antigos costumes indígenas, como fez o professor Hermano, já demonstra que certas coisas devem ficar no passado mesmo.

E vamos ser francos, os índios já não mantém muitos dos seus antigos costumes, e isto não é nada mais do que normal. Eu que tenho o sobrenome “Oliveira” de uma parte e “Pereira” de outra, talvez devesse dançar fado, comer bacalhau rotineiramente, usar bigode, abrir uma padaria e, o que é pior, torcer pelo Vasco da Gama para manter os costumes dos meus antepassados remotos, mas isto nem de perto passa por minha cabeça.

Indo um pouco mais longe: imaginem se em nome de tal preservacionismo cultural tenhamos que defender o infanticídio perpetrado por algumas tribos brasileiras; ou pedir um retorno do canibalismo dos tupinambás, ou mesmo dos sacrifícios humanos dos astecas.

Os índios já não andam mais nús, eles assistem TV, utilizam a Internet (acessem o blog dos jovens indígenas de Dourados:
www.ajindo.blogspot.com), usam fogão e geladeira, têm celulares, moram em casas de alvenaria, têm água encanada, enfim, é uma piada de mau gosto querer que eles voltem a um modo de vida de cinco mil anos atrás.

Julgar que o índio não deve se integrar na sociedade é que é um preconceito de nossos indigenistas. Ao fazer isto estaria se outorgando que os índios não têm capacidade de serem o que quiserem ser (médicos, professores, advogados, etc), mas que apenas deveriam viver eternamente num modo de vida coletor-extrativista, ou seja, primitivo.

Praticamente todos os anos vou ao Bon Odori, a festa típica japonesa. Também já fui à Oktoberfest dos alemães e todo ano participo de nossas festas juninas. Eu penso que todas remetem aos costumes e à antiga cultura dos respectivos antepassados. A cultura indígena, para mim, não deve diferir disso, ou mesmo do nosso churrasco com mandioca ou do tereré que também foi influência indígena.

Querer mais do que isso é tentar, inutilmente, manter os índios num museu a céu aberto.




Obs: O Hermano bem que podia ser o Tomatinho do desenho abaixo. Eu não sou o Fudêncio porque não fico vendendo bugiganga pros índios.